Fiquei sabendo da partida de Tanea Romão, neste sábado (19), aos 58 anos pela postagem dos colegas da Prazeres da Mesa. Nunca fomos muito próximos, embora ela sempre me tratasse sempre com muita doçura – Tanea era de uma amabilidade única, sempre com um sorriso aberto. A primeira vez que ouvi falar da chef foi na época que ela teve o restaurante Kitanda, em Tiradentes, casa que já tinha funcionado em Gonçalves, entre 2009 e 2016. Era o projeto de uma ex-metalúrgica que aos 30 anos descobriu o prazer de cozinhar. Em um feriado como este, fui à cidade mineira turística e tentei uma mesa no restaurante, que infelizmente não funcionou naquela que deveria ser uma das épocas mais lucrativas do ano.
Precisei esperar até Tanea transferir o Kitanda para São Paulo, na Vila Romana. Visitei o restaurante um par de vez para confirmar que a cozinheira transformava o trivial em uma alegria para o cotidiano. Era uma cozinha simples, mas repleta de gosto singular. Mas a casa do número 983 da Rua Catão não tinha um funcionamento regular – administrar financeiramente um restaurante não é fácil. Foi justamente a difícil equação financeira e não o sabor da cozinha que levou Tanea a inscrever o Kitanda no Pesadelo na Cozinha, reality conduzido por Erick Jacquin. Ela participou da terceira edição do programa levado ao ar em 2021 – as gravações foram feitas em 2020, pouco antes da decretação da pandemia. Depois da reforma, o endereço se transformou na Casa da Tanea.

Embora tenha tido essa reprogramação, o restaurante não resistiu aos efeitos da pandemia e fechou as portas em novembro de 2023. Abalada emocionalmente com a perda, Tanea, definida pela revista Prazeres da Mesa como “ativista, que trabalhou em prol do Movimento Slow Food, e foi atuante na Aliança dos Cozinheiros” e que percorreu “os salões do Terra Madre, em Turim, onde promovia os produtos e produtores brasileiros, com seu sorriso permanente e disponível a colaborar com todos”, a cozinheira acomodou a vida em uma mala e mudou-se para São Gabriel da Cachoeira.
Ao deixar São Paulo, Tanea conheceu São Gabriel da Cachoeira, ao norte do Amazonas. Foi uma paixão avassaladora. População, ingredientes, preparações… Um aprendizado sem fim. Sem qualquer vaidade, Tanea tornou-se por lá merendeira. “Essa floresta e esse ‘marzão’ de água doce, o Rio Negro, é curativo. Nos transporta para um lugar mágico. No começo, nem eu sabia porque estava vindo, mas hoje entendo que era para viver esse luto”, disse à equipe do MasterChef ao adotar a nova moradia.
Conversei com a amiga Denise Rohnelt Araujo, pesquisadora de culinária amazônica em Boa Vista (RO). Além da diabetes que acompanhava, Tanea foi vitimada pela Covid-19 que continua a afetar as pessoas.
A amiga Janaína Torres está entre os muitos chefs que lamentaram a passagem de Tanea. “Hoje (sábado, 19) perco além de uma amiga , uma parceira do A Brasileira, muita gente não sabe, mas tínhamos combinado que ela viria trabalhar comigo na cozinha do projeto. Tanea era uma joia da cozinha brasileira, intima conhecedora da cozinha ancestral, afro e popular. Foi uma grande perda pro nosso projeto e pra todo Brasil. Agora, em maio tinha marcado de encontrá-la em São Gabriel e lá faríamos em esboço do que gostaríamos de mostrar sobre a genuína alta cozinha popular brasileira e começar a preparar sua vinda pra São Paulo . Ahhhhh , não deu tempo ! Mas fico agora com a missão de fazer tudo que combinamos e lutar pela alta cozinha inclusiva. Por você, por nós e pelo nosso Brasil que você tanto amava”, declarou no Instagram.
A constelação de chefs perde mais uma de suas representantes.
Fonte.: Veja SP Abril