Depois de muita reflexão, resolvi tirar o band-aid de uma vez: não existe vinho romântico. Se você está buscando dicas para o Dia dos Namorados, como tantos fazem no Google (onde, no autocompletar, estão “vinho para apimentar a relação” e “vinho para o primeiro date”, entre outras), a ideia é menos buscar uma bebida “romântica” e mais uma que seja gostosa. É engraçado, pouca gente fala em vinho gostoso, mas eles podem sê-lo, e muito.
O vinho, nesta comemoração específica, deve ser encarado como se faz com a comida, a iluminação e a música, é fundamental para criar um clima. Um vinho gostoso, bom, deixa a gente mais feliz e mais relaxado —a tal história do lubrificante social. Não tem vinho romântico per se, mas, quando compartilhamos uma garrafa e apreciamos juntos o que está ali, nos aproximamos.
Flores são românticas. Um vinho floral seria romântico? Tem gente que acha enjoativo. Enjoativo não é romântico.
Por outro lado, tem vinho antirromântico: os que pesam, nos deixam inflados, os que têm acidez baixa, são muito alcoólicos e nos deixam imediatamente passados do ponto. Aí não tem tesão que seja solução.
Se a relação está boa, isso já é motivo para celebrar e as borbulhas têm cara de festa. Espumantes, dos mais simples aos mais sofisticados, oferecem prazer e combinam com uma imensa gama de comidas. Isso porque a perlage faz uma boa faxina na boca e tira qualquer traço da garfada anterior, preparando o ambiente para a próxima. Vão com ostras e com frituras, com frios e quentes.
Se a marcação do termômetro descer, o que é provável, a uva garnacha é uma das minhas favoritas, especialmente nos vinhos mais simples, que costumam entregar mais leveza, um sabor delicioso de cereja fresca, uma alegria única. Ainda assim, não se engane, esses vinhos são alcoólicos o suficiente para esquentar dos pés à cabeça —o que não deve ser má ideia e pode favorecer outros tipos de atividade.
Também acho que se você quer comemorar com seu namorado ou namorada e não está muito a fim de encarar um salão de restaurante lotado, vale se esmerar um pouco mais na escolha, afinal, se for abrir a garrafa em casa, ela sai a um preço mais baixo, sem a margem do restaurante. Um vinho especial, mais antigo, algo que esteja guardado esperando o momento certo, algo que você tem vontade de provar e nunca teve coragem de gastar, pode ser o vinho certo para a ocasião.
Outro dia vi um vídeo bem-humorado da Rita Lobo vestida para o Dia dos Namorados com um longo dourado, muito chique, como quem vai para um baile. Acontece que, em vez disso, ela se reclina no sofá, pega uma louça cheia de pipoca e anuncia ao seu amor que estava prontíssima para a comemoração. Na hora, pensei: tomara que ela abra um chardonnay com passagem por barrica usada. Essa uva, quando estagia em carvalho, pode sair com um toque de manteiga. Se a barrica é muito nova, fica enjoativo. Se é usada, fica no ponto certo. A pipoca crocante com um vinho idem (há quem diga que um vinho cheio de acidez é crocante!), e ambos com toque de manteiga, quer combinação melhor?
Cozinhar para alguém que se ama ou, melhor ainda, com alguém que se ama é mais romântico que a comida em si. Bebendo vinho ao longo da atividade, é mais prazeroso. Se a comida for um fracasso e o vinho deixar a desejar, aposto que a memória ainda vai ser positiva, ninguém vai chorar, só vai sorrir.
Vai uma taça? Para quem gostou da ideia de provar um garnacha, amo o Rochapel (R$ 109 na Degusti) e o Latido de Sara (R$ 128 na Belle Cave), que são festivos e têm as notas de cereja bem nítidas. O espumante Lidio Carraro Faces Rosé Brut (R$ 74 na Toque de Vinho) é bem fresco, levinho e vai bem para o brinde e para comidinhas. Se pode gastar mais e quer que o assunto renda, o pét-nat (espumante de método ancestral) Celler Tuets Tot Ancestral (R$ 303 na Vinci), feito com parellada e macabeu, é divino, uma descoberta do sommelier Danyel Steinle, que está no novo menu do Nelita. Para a pipoca, o Kaipu Chardonnay 2023 (R$ 52 na Wine) é um ótimo custo-benefício.
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Fonte.:Folha de São Paulo