8:27 PM
26 de dezembro de 2025

OEA aponta ameaça à liberdade de expressão no Brasil

OEA aponta ameaça à liberdade de expressão no Brasil

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O relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da OEA (Organização dos Estados Americanos), alerta para os perigos da ausência de definições claras e precisas para conceitos como “desinformação” e “discurso de ódio” no Brasil. Segundo o documento, divulgado nesta sexta-feira (26), o uso indiscriminado desses termos ameaça a liberdade de expressão no país.

O parecer é resultado da visita oficial de Pedro Vaca, relator especial para a liberdade de expressão da CIDH, realizada em fevereiro, a convite do governo Lula. A missão teve como objetivo analisar a situação de liberdade de expressão no Brasil.

A relatoria reconhece que o Supremo Tribunal Federal (STF) “desempenhou um papel fundamental” ao investigar os atos do 8 de janeiro, considerados pelo órgão como uma tentativa de golpe. No entanto, alerta que essas medidas devem ser temporárias, pois, se prolongadas, concentram excessivamente o poder e criam “precedentes que possam ser usados por regimes potencialmente autoritários no futuro”.

CIDH recomenda que decisões judiciais sejam mais fundamentadas

O documento também recomenda que o Judiciário explicite fatos, motivos e normas que embasam suas decisões, evitando qualquer indício de arbitrariedade. “Não basta invocar a possibilidade de limitação do direito”, afirma o parecer, destacando que é necessário demonstrar como os fatos se enquadram nas regras aplicadas, sempre considerando as alegações das partes e as provas apresentadas.

Além de “desinformação” e “discurso de ódio”, palavras usadas pelo Judiciário para sustentar reações de censura, o relatório cita outros termos que precisam de maior precisão para garantir segurança jurídica. “Conceitos como ‘desordem informacional’ e ‘informação gravemente descontextualizada’ não são categorias suficientemente explícitas para atender aos requisitos de legalidade na restrição da liberdade de expressão, uma vez que não fornecem limites claros e previsíveis entre expressões lícitas e ilícitas”, aponta o documento.

Andrea Hoffmann, presidente do Instituto Isabel, que acompanhou a visita de Pedro Vaca, destaca que, embora o parecer não tenha força normativa, seu peso político é significativo. “Quando recomendações dessas relatorias não são cumpridas, a imagem do país é afetada negativamente. A tendência é que a CIDH continue cobrando, de forma política, os órgãos responsáveis”, avalia.

“Um relatório que apresenta 22 recomendações ao Brasil, no mínimo, reconhece que há violações à liberdade de expressão no país. Isso, por si só, já representa uma vitória política. Agora, como sociedade, é preciso exigir a solução de todos os problemas apontados pela OEA, que contrariam o ordenamento jurídico internacional”, complementa.

Parecer defende que restrições a discurso parlamentar devem ser extremamente limitadas

A imunidade parlamentar foi outro ponto destacado no parecer. A relatoria ressaltou que esse direito deve estar sujeito rigorosamente à proporcionalidade, sendo muito limitada a regulamentação do discurso parlamentar para garantir a liberdade de expressão. “A responsabilização dos parlamentares, por meio de mecanismos disciplinares ou judiciais, não deve ser feita de forma a inibir sua atividade parlamentar e afetar expressão especialmente protegida pela Convenção Americana”, afirma.

Três meses antes da visita de Pedro Vaca ao Brasil, parlamentares brasileiros de direita viajaram a Washington para denunciar casos de censura à OEA. A reunião foi suspensa de última hora, mesmo após os parlamentares organizarem toda a viagem com recursos públicos. A justificativa da Comissão foi que o assunto seria tratado posteriormente no Brasil, após o convite feito pelo Itamaraty.

O parecer relata que parlamentares informaram, aqui no Brasil, que não tiveram suas prerrogativas funcionais respeitadas quanto à liberdade de expressão. Um dos casos citados é a condenação da deputada federal Bia Kicis (PL-DF) e do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) ao pagamento de R$ 30 mil por divulgarem nas redes sociais um vídeo de Lula durante o debate eleitoral. Na decisão, o ministro Alexandre de Moraes afirmou que o conteúdo veiculava “desinformação”, ao distorcer a fala do então candidato.

Bia Kicis ressalta que o documento ainda precisa ser analisado com mais profundidade, mas destaca pontos positivos, como a recomendação para descriminalizar os crimes de calúnia, injúria e difamação. Caso isso ocorra, esses casos passariam a ser julgados apenas na esfera civil.

“Vejo esse relatório da CIDH como uma luz em meio a tanta escuridão que temos vivido. Continuaremos denunciando todos os crimes contra os direitos humanos que têm sido cometidos, e esperamos chegar logo na anistia dos presos políticos”, declara.

Hoffmann também avalia que o relatório traz diversas recomendações positivas e pode impulsionar a criação de leis que reforcem a liberdade de expressão. “Essas recomendações permitem pressionar decisores públicos e políticos. Por exemplo, as limitações apontadas em relação ao Supremo podem gerar pressão política sobre a atuação dos ministros”, conclui.



Fonte. Gazeta do Povo

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