
À medida que medicamentos que imitam o hormônio natural GLP-1, como a semaglutida (base do Ozempic e Wegovy) e a tirzepatida (do Mounjaro), demonstram resultados cada vez mais potentes para a redução do peso, cresce também a preocupação com um efeito colateral importante: a perda de massa magra.
Pesquisadores alertam que parte do peso eliminado com essas drogas não é apenas gordura e temem que isso possa aumentar o risco de sarcopenia, a perda progressiva de massa muscular, força e função, geralmente relacionada ao envelhecimento.
O tema, porém, é complexo e ainda rende muitos estudos. Isso porque a “massa magra” representa tudo o que não é gordura, incluindo órgãos, ossos, fluidos e água no tecido adiposo. Sendo assim, nem sempre a queda nesse indicador significa perda de músculos.
No entanto, o uso indiscriminado de estratégias para emagrecimento, sem a devida indicação, pode, sim, induzir a problemas mais graves, como a sarcopenia. Entenda melhor a seguir:
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Canetas de GLP-1 reduzem massa magra?
Sim. A perda de peso, seja com as “canetas emagrecedoras”, cirurgia bariátrica ou dietas, sempre gera uma queda proporcional da massa magra. Quanto mais quilos são eliminados, maior tende a ser a redução dessa massa.
Uma meta-análise de pacientes submetidos à bariátrica, por exemplo, já havia mostrado que a redução de massa livre de gordura pode chegar a 8 kg no primeiro ano, representando cerca de 21% a 22% do peso total perdido.
No caso das canetas emagrecedoras, o fenômeno é similar. Estudos sugerem que a diminuição da massa magra pode corresponder a um valor entre 25% e 39% do peso total perdido em 36 a 72 semanas de uso de análogos do GLP-1.
Segundo uma análise publicada na revista The Lancet, essa redução é considerada substancial e muito acima daquela que acontece naturalmente com o passar da idade. Com o envelhecimento, observa-se uma redução da massa muscular em cerca de 0,8% ao ano e 8% por década entre os 40 e 70 anos.
Ainda assim, os autores reforçam que esse efeito parece estar mais relacionado à magnitude da perda de peso do que a uma ação direta das substâncias (hipótese que ainda precisa ser confirmada).
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Outros contrapontos
Entre reduzir massa magra e causar, de fato, perda muscular ou, principalmente, sarcopenia, existe um abismo. E essas profundezas ainda precisam ser melhor exploradas pela ciência.
Em primeiro lugar, os resultados das investigações sobre o assunto variam muito. Algumas pesquisas sugerem que até 60% do peso perdido poderia vir da massa magra, enquanto outras apontam para índices bem menores, próximos de 15%.
É preciso reforçar, ainda, que perder massa magra não significa necessariamente perder músculos, já que essa medida inclui também o tamanho de órgãos, ossos, líquidos e a água presente no tecido adiposo. A maioria dos estudos já feitos, porém, não fazem essa diferenciação.
Como até 15% da gordura corporal contém componentes classificados como “massa magra”, grandes perdas de gordura também podem contribuir com a redução desse tipo de massa, distorcendo a interpretação sobre o músculo.
“É como se eu tivesse um filé que estava todo cheio de gordura; eu tirei a gordura e ficou só o filé. Então, às vezes, a diminuição da massa magra, na verdade, pode ser uma diminuição da chamada miosteatose, que é a redução da gordura no músculo”, diz Fabio Moura, diretor da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem).
E quando o risco é real?
O risco de perda muscular e sarcopenia é maior em pessoas que já começam o tratamento mais vulneráveis, como idosos, sedentários ou quem tem alimentação pobre em proteínas e micronutrientes.
Nesses casos, a chance de impacto funcional é maior, o que exige cautela na indicação das terapias de perda de peso.
“Algumas pessoas tomam esses remédios e não têm um plano alimentar adequado. Ficam realmente sem comer, têm uma ingestão calórico-proteica muito baixa e acabam desnutrindo“, destaca Moura.
Além disso, o médico é taxativo: o conjunto desses fatores mostra que pessoas com peso normal ou sem indicação clínica não deveriam consumir os medicamentos. “Fica óbvio que quem toma essas drogas para perder peso de forma recreativa – ou seja, puramente estética –, sem nenhuma dúvida tem risco maior de ter uma perda de massa magra“, diz o endocrinologista.
Ozempic e afins causam sarcopenia?
Apesar da preocupação, especialistas destacam que os análogos de GLP-1 não causam sarcopenia por si só.
A condição não é definida apenas por menor massa magra, mas pela combinação de perda de músculo com queda de força e de desempenho físico.
Como explica Moura, “a diminuição de massa magra é um fator que favorece o desenvolvimento de sarcopenia, mas não é sarcopenia em si”, e, até o momento, não há evidências de que esses fármacos causem atrofia muscular.
Como prevenir perda de massa ao usar canetas emagrecedoras
Ainda assim, no esforço para reduzir os efeitos indesejáveis, a indústria farmacêutica já busca alternativas que preservem ou aumentem o tecido muscular durante o emagrecimento.
Entre os exemplos, a Eli Lilly, fabricante do Mounjaro e do Zepbound, investe em pesquisas sobre combinações com o bimagrumabe, droga que bloqueia receptores envolvidos na regulação dos tecidos adiposo e muscular, favorecendo o crescimento do músculo. Enquanto isso, estudos que unem bimagrumabe e semaglutida também já estão em andamento.
Já pesquisadores da Universidade de Alberta, no Canadá, também investigam o uso de um suplemento de cetonas para evitar a perda muscular associada à semaglutida. Em testes com animais, a combinação teve efeito positivo.
Apesar disso, especialistas ressaltam que levará anos até que soluções desse tipo cheguem ao mercado.
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Enquanto isso, a prevenção continua dependendo de estratégias já conhecidas. Os médicos costumam recomendar duas soluções simples para combater a perda muscular: consumir proteínas e praticar musculação.
“Então, essa perda de massa magra — quando real, acompanhada de perda de força — é consequência direta da baixa ingestão calórico-proteica”, explica Moura.
Por isso, a recomendação é manter uma ingestão adequada de proteínas – entre 1,2 e 1,5 gramas por quilo de peso ao dia – e praticar exercícios, especialmente os resistidos, como a musculação, pelo menos três vezes por semana.
Por fim, é importante, ainda, lembrar de não exagerar no nutriente. Estudos indicam que o consumo excessivo de proteínas não traz mais músculos e ainda pode aumentar o risco de doenças cardiovasculares.
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Fonte.:Saúde Abril


