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27 de dezembro de 2025

Pasquale deu dicas de gramática com música de Veloso – 27/12/2025 – Folha 105 anos

Pasquale deu dicas de gramática com música de Veloso – 27/12/2025 – Folha 105 anos

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Pasquale Cipro Neto usou uma canção de Caetano Veloso para falar de gramática sem cara de manual. Ele partiu de “Língua”, que já havia entrado em prova de vestibular, e transformou os versos em discussão sobre o que a língua portuguesa tem de particular.

A coluna foi publicada na Folha em 1999, e lembrou que, na Unesp, o texto de Caetano foi associado ao poema “Língua Portuguesa”, de Olavo Bilac. Para chegar ao título “Inculta & Bela”, Pasquale citou o começo parnasiano do poema: “Última flor do Lácio, inculta e bela/ És a um tempo esplendor e sepultura…”.

Daí, ele passou a conduzir o leitor diretamente. “Descobriu de onde vem o nome desta coluna?”, perguntou, antes de prometer que “um belo dia” tentaria explicar Bilac. Por ora, preferiu “discutir um pouco do de Caetano”.

A letra entrou em cena com o verso inteiro: “Gosto de sentir a minha língua roçar a língua de Luís de Camões”. Pasquale listou sentidos possíveis desse “roçar”: a língua do Brasil abrindo caminho na de Camões, mas também as duas línguas se encostando e “misturando suas pernas”.

Leia a seguir o texto completo, parte da seção 105 Colunas de Grande Repercussão, que relembra crônicas que fizeram história na Folha. A iniciativa integra as comemorações dos 105 anos do jornal, em fevereiro de 2026.

“Gosto de ser e de estar” (2/12/1999)

A letra de “Língua”, escrita por Caetano Veloso em 1984, já foi incluída na prova de português de alguns vestibulares, entre eles o da Unesp (Universidade Estadual Paulista). Nesse exame, o texto de Caetano foi associado ao poema “Língua Portuguesa”, escrito por Olavo Bilac em 1914. De estrutura parnasiana, o poema de Bilac começa assim: “Última flor do Lácio, inculta e bela/ És a um tempo esplendor e sepultura…”. Descobriu de onde vem o nome desta coluna? Prometo um belo dia tentar explicar o texto de Bilac.

Por enquanto, vamos discutir um pouco do de Caetano, que começa assim: “Gosto de sentir a minha língua roçar a língua de Luís de Camões. Gosto de ser e de estar e quero me dedicar a criar confusões de prosódias e uma profusão de paródias que encurtem dores e furtem cores como camaleões”. Entre os vários sentidos de “Gosto de sentir a minha língua roçar a língua de Luís de Camões”, está o de que a língua do Brasil (“a minha língua”) abre seu caminho (“roçar”) na de Camões. Também está o de que as duas línguas se roçam, misturam suas pernas.

Em seguida, a letra de “Língua” diz: “Gosto de ser e de estar”. O que é isso? Lembra-se de Eduardo Portella (ministro da Educação do governo Geisel, se não me engano)? Um belo dia, Portella disse: “Eu não sou ministro; estou ministro”. Pois é, em inglês, “ser” é “to be” e “estar” também é “to be”. “Eu não sou” e “Eu não estou” se traduzem por “I am not”. Como seria a frase do ministro Portella em inglês? Certamente seria preciso acrescentar alguma expressão adverbial para diferenciar a idéia de estado constante (ser ministro) da de estado momentâneo (estar ministro). Entendeu por que Caetano diz “Gosto de ser e de estar”? O poeta simplesmente diz que gosta do que a língua portuguesa tem de seu, de particular.

Os vestibulares estão em pleno andamento, e é bom saber que o preconceito contra a letra de música popular está definitivamente superado. Seja na prova de língua, seja no tema da redação, Fuvest, Unesp, Unicamp, PUC e várias das universidades federais e estaduais usam e abusam das letras dos nossos bons poetas musicais. Caetano é um dos que mais aparecem. É isso.



Fonte.:Folha de S.Paulo

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