Tema rodeado de estigmas sociais, saúde mental se tornou assunto primordial na vida dos brasileiros. Quando a vida perde o sentido, quando recursos materiais se mostram escassos e quando não há vaga para atendimento psicológico nos postos de saúde, o equilíbrio emocional é colocado em risco.
A isso se somam condições de trabalho insalubres, o perigo da violência e da morte precoce, bem como a pressão exercida pela ditadura da autoestima digital. As doenças físicas e a fome, que fragilizam o corpo, também corroem o bem-estar. Todas essas situações, somadas, comprometem psicológico, espírito e alma.
O aumento da ansiedade, depressão, auto-lesão e suicídio reflete desigualdades sociais, falta de estrutura pública e descaso político e familiar, empurrando milhares a apenas tentar sobreviver. É aí que o incômodo aparece: na era do digital e do distanciamento humano, responsabiliza-se o indivíduo. No entanto, por trás de todas as dores, há uma causa social.
O peso do vazio emocional muitas vezes vem da fome por alimento, segurança e autoestima, esta que se inicia ainda no ventre e permeia toda nossa vida em um processo eterno de construção. E os jovens? Aos jovens tem restado o futuro incerto, a briga entre gerações que discutem entre si suas ditas verdades e vaidades, as quais, não raro, são apenas pontos de vista.
Lembrando que o setembro amarelo surgiu em 1994, nos EUA, após o suicídio de Mike Emme, de 17 anos. Dono de um Mustang amarelo, sua família iniciou uma campanha com cartões presos a fitas amarelas.
Não se trata de buscar culpados, mas de aliviar a dor de quem sofre. No Brasil, a dor mental tem intensidade e rosto: ela se manifesta de acordo com nome, cor, gênero, CEP, classe social, idade e orientação sexual. Os recursos para enfrentá-la, materiais e psicológicos, são desiguais.
Por isso, a solução não pode ser individual, e sim coletiva. Nossos antepassados já nos mostraram que cuidado, atenção ao outro e construção de comunidades solidárias e resilientes são os caminhos possíveis, que devem ser ancorados pela justiça social.
Na pandemia, o Brasil assistiu à explosão dos problemas mentais. O silêncio, se aliado com culpabilização e responsabilização individual, põe mais um fardo nas costas de quem tenta sobreviver ao Brasil desigual.
Datas comemorativas lembram a importância de cuidar da saúde mental, mas não bastam por si só. Esse cuidado precisa ser constante, vivido diariamente, tanto de forma individual quanto coletiva.
Além disso, instituições sociais têm papel decisivo nesse cenário. Na Rede Autoestima-se, organização sem fins lucrativos voltada à saúde mental, já foram realizados mais de 2.000 atendimentos psicológicos, ampliando o acesso gratuito ao acolhimento especializado para jovens, mulheres e empresas.
O medo da loucura atravessa séculos e sustenta o estigma. Antes, eram os manicômios, com pessoas isoladas e condenadas à invisibilidade. Hoje, há menos hospitais, mas o rótulo persiste. A fragilidade emocional ainda é tratada como fraqueza individual, e não como reflexo de uma sociedade que adoece.
A saúde mental do brasileiro não se resolve apenas com força de vontade. Freud nos lembra que “não somos totalmente donos de nossos atos”. Séculos de manicômios, isolamento, desigualdades e medo da loucura mostram que a sociedade historicamente marginaliza o sofrimento.
Reconhecer isso é admitir que cuidar da saúde mental exige responsabilidade coletiva. E, como jovem, nos meus 23 anos, nascida nas desigualdades, prefiro acreditar que ninguém se liberta sozinho: os homens e as mulheres se libertam em comunhão, parafraseando o célebre Paulo Freire.
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Fonte.:Folha de S.Paulo


