
Crédito, EPA
- Author, Tom Bateman
- Role, Correspondente da BBC News nos EUA
O reconhecimento do Estado da Palestina por Reino Unido e França nas Nações Unidas (ONU) representa um momento histórico no conflito centenário entre israelenses e palestinos.
O anúncio da França foi feito na segunda-feira (22/09) durante a conferência de um dia na ONU em Nova York para discutir a Questão Palestina e a Implementação da Solução de Dois Estados. O evento foi boicotado por Israel e os EUA.
A decisão francesa é uma aposta diplomática e revela que as principais potências europeias consideram que o conflito chegou a um ponto que exige uma ação sem precedentes.
Diante da catástrofe em Gaza e ao condenar Israel e Hamas, o presidente da França, Emmanuel Macron, disse que “o direito deve prevalecer sobre a força”.
A medida, articulada com o Reino Unido e patrocinada pela Arábia Saudita, busca manter viva a solução de dois Estados.
As potências europeias veem nessa fórmula internacional de paz, adotada há décadas, o único caminho para um futuro compartilhado entre israelenses e palestinos.
A alternativa à convivência entre os dois Estados, afirmou o secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, em conferência em Nova York, seria uma solução de “Estado único”, com dominação israelense e “subjugação” dos palestinos.
“Nada pode justificar o castigo coletivo, a fome ou qualquer forma de limpeza étnica”, disse Guterres.
Israel reagiu com fúria e ameaçou retaliação. O país vê a conferência da ONU — somada ao reconhecimento de um Estado palestino por Reino Unido, França, Canadá, Austrália e outros — como uma recompensa ao Hamas pelo ataque a Israel e pelo sequestro de reféns em 7 de outubro de 2023.
Alguns ministros israelenses defendem que a resposta seja o anúncio da anexação de partes da Cisjordânia já ocupada por Israel, eliminando permanentemente a possibilidade de um Estado palestino viável no território.
A coalizão governista do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, que inclui figuras de extrema-direita cujo objetivo declarado é expulsar os palestinos e construir assentamentos judaicos em seu lugar, pretende encerrar de vez a solução de dois Estados.
A administração do presidente americano, Donald Trump, mantém apoio a Israel, rejeita a iniciativa europeia e puniu o presidente da Autoridade Palestina (PA), Mahmoud Abbas. Ele foi impedido de participar da conferência da ONU em Nova York e teve que falar por videoconferência.
A conferência sobre a Palestina e a reação do governo Trump marcam a divisão mais profunda entre Washington e seus aliados europeus sobre como resolver o conflito no Oriente Médio.
Os europeus afirmam ter poucas opções diante da situação em solo.
Israel está mobilizando uma terceira divisão do Exército em Gaza, com dezenas de palestinos mortos todos os dias; o Hamas mantém cerca de 50 reféns, muitos deles mortos; e a Cisjordânia vive a expansão de assentamentos israelenses e da violência de colonos israelenses.
Tudo isso ocorre quase dois anos após os ataques de 7 de outubro de 2023, sem sinais de que mais pressão militar levará à rendição do Hamas desejada por Israel.
A estratégia do presidente francês, Macron, tenta mostrar que a diplomacia oferece uma alternativa viável: primeiro, encerrar de forma funcional a guerra em Gaza; depois, alcançar uma solução de longo prazo com dois Estados — um israelense e um palestino.
Os países europeus argumentam que a estratégia israelense falhou, resultando apenas em mais sofrimento à população civil e colocando em risco os reféns restantes.
A conferência da ONU foi conduzida também pela Arábia Saudita e recebeu apoio da Liga Árabe.
A França sustenta que isso demonstra que sua diplomacia pode exercer influência sobre o Hamas, pois países árabes-chave presentes na conferência pediram que o grupo se desarme e entregue suas armas à Autoridade Palestina, acrescentando que não poderá ocupar cargos de liderança no futuro para os palestinos.
Macron acredita que o processo diplomático cria um incentivo para Israel e mantém aberta a possibilidade de normalização das relações com a Arábia Saudita — objetivo antigo de Netanyahu e Trump.
Tanto Macron (França) quanto Keir Starmer (Reino Unido) lembraram os legados coloniais de seus países no Oriente Médio.
Eles lembraram que, após a saída do Reino Unido da Palestina histórica em 1948, a comunidade internacional reconheceu o Estado de Israel.
Agora, afirmaram, reconhecem o direito igual dos palestinos a seu próprio Estado.

Crédito, EPA
Ao subir ao púlpito da ONU, Macron tentou assumir um papel de liderança global para buscar uma saída do “pesadelo” em Gaza, como definiu o secretário-geral da ONU, e encontrar um futuro compartilhado entre israelenses e palestinos.
No entanto, em termos de poder bruto, este não é o presidente “certo”.
Sem os Estados Unidos liderando o esforço, não há a mesma pressão significativa que apenas Washington pode exercer sobre todos os lados.
O governo Trump mantém a rejeição à abordagem europeia de reconhecer o Estado da Palestina.
Após seu discurso na Assembleia Geral da Onu na terça-feira, Trump se reuniu com líderes de países árabes e muçulmanos para discutir o conflito em Gaza. Trump disse que a reunião incluiu “todos os grandes atores, exceto Israel, mas esse será o próximo”, em aparente referência ao seu encontro com o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu na Casa Branca na próxima semana.
Entre os participantes da reunião estavam líderes árabes como Arábia Saudita, Emirados Árabes Unidos e Catar, que atuou como mediador entre Israel e Hamas anteriormente, mas ainda se recusa a se envolver novamente nas negociações depois de Israel atacar líderes do Hamas em seu território no início de setembro.
Já os palestinos receberam com aprovação o reconhecimento pelos países europeus, mas sabem que essas eram as superpotências do passado. Suas decisões não têm mais o mesmo peso.
A viabilidade de um Estado palestino depende do apoio da superpotência atual, os Estados Unidos.
Fonte.:BBC NEWS BRASIL