
Crédito, Reuters
- Author, Cristina J. Orgaz
- Role, BBC News Mundo
- X, @cjorgaz
O preço do ouro atingiu um recorde histórico de mais de US$ 4 mil (cerca de R$ 21 mil) por onça (31,104 gramas), impulsionado pela busca dos investidores por ativos seguros para investir diante da incerteza econômica e política mundial.
Os analistas afirmam que outro fator que preocupa os investidores são os atrasos na divulgação de dados econômicos importantes, agora que a paralisação do governo americano entra em sua segunda semana.
Uma paralisação do governo dos EUA ocorre quando o Congresso não aprova o orçamento federal a tempo, e os órgãos públicos precisam suspender serviços não essenciais.
Dessa forma, o ouro atua como um termômetro silencioso dos temores do mercado.
“O preço do ouro superou o famoso patamar de US$ 4 mil por onça e continua batendo novos recordes a cada dia. Só neste ano, o ouro já alcançou 52 novos recordes históricos”, explica Reghina Hammerschmid, gestora de carteiras na Vontobel.
“O retorno acumulado este ano é de aproximadamente 54%, o que já representa a maior rentabilidade anual desde 1979”, analisou.
O preço do ouro à vista — o valor de mercado em tempo real do metal precioso para entrega imediata — dobrou nos últimos três anos.
“É uma alta com poucos precedentes. A primeira aconteceu após a suspensão dos acordos de Bretton Woods, nos anos 70, quando a conversibilidade do dólar em ouro terminou”, lembra Marco Mencini, chefe de análises na Plenisfer Investimentos.
Para Carsten Menke, diretor de pesquisa da Julius Baer, as razões deste para essa alta histórica se devem ao “desaquecimento da economia americana, junto com as perspectivas de taxas de juros mais baixas e um dólar mais fraco“.
Isso “deve continuar atraindo investidores que buscam ativos seguros”, afirma o analista, observando que a tendência pode se manter.
Paralisação do governo
E não é a primeira vez que isso acontece.
Em paralisações anteriores, os investidores também buscaram refúgio no ouro. O metal precioso subiu quase 4% durante a paralisação de um mês no primeiro mandato de Trump na Casa Branca.
“Os ataques de Trump à independência do Fed [banco central americano] e ao Estado de direito provavelmente deram um impulso a mais” à cotação do ouro, menciona Claudio Wewel, estrategista de câmbio na J. Safra Sarasin Sustainable AM.
O “aumento sem precedentes” do ouro no último mês superou as expectativas dos analistas, disse Heng Koon How, chefe de estratégia de mercados do banco UOB.
Ele acrescentou que a alta também está vinculada ao enfraquecimento do dólar americano e o aumento da compra de ouro por compradores não oficiais, conhecidos como investidores de varejo.
Gregor Gregerson, fundador da Silver Bullion, fornecedora de cofres e metais preciosos, afirmou que seu número de clientes mais que dobrou no último ano.
Investidores de varejo, banco e famílias com dinheiro têm recorrido cada vez mais à compra de ouro, enxergando-o como uma proteção contra a incerteza econômica mundial.
“A maioria dos nossos clientes são detentores de longo prazo”, afirmou Gregersen, explicando que a maioria deles armazena o ouro durante mais de quatro anos.
“O ouro cairá em algum momento, mas acredito que, diante desse cenário econômico, a tendência de alta deve durar pelo menos cinco anos.”
Rompendo a dependência do dólar
Embora o atual aumento dos preços do ouro se deva à incerteza a curto prazo, a força geral do ouro se deve, em grande parte, ao fato de que os bancos centrais vêm comprando o metal como estratégia para se afastar dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos e de uma dependência excessiva do dólar.
O ouro é um dos principais ativos de reserva dos bancos centrais, que o utilizam para se proteger contra a inflação e o risco de mercado, e estas instituições têm aumentado suas posições, de acordo com o Conselho Mundial de Ouro.
Os bancos centrais compraram, em conjunto, mais de 1 mil toneladas de ouro por ano desde 2022, em comparação a uma média anual de 481 toneladas entre 2010 e 2021.
Polônia, Turquia, Índia, Azerbaijão e China estavam entre os principais compradores no ano passado.

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Heng lembra que, em 2022, o ouro despencou de US$ 2 mil para US$ 1,6 mil por onça, depois que o Banco Central dos EUA aumentou as taxas de juros para conter a inflação provocada pela pandemia de covid-19.
Um risco-chave para a força do ouro é o aumento repentino da inflação, que poderia levar os EUA a subirem novamente os juros.
O recente aumento no preço do ouro reflete as expectativas de que o Fed abaixe os juros, o que tornará o ouro ainda mais atrativo, afirmou Wong.
Enquanto isso, Trump já aumentou a pressão sobre o banco central, criticando publicamente seu presidente, Jerome Powell, por não cortar os juros com rapidez, e tentando demitir uma das diretoras da instituição, Lisa Cook.
A estratégia do presidente contra o Fed pode “minar a confiança em sua capacidade para atuar como um banco central confiável e com metas de inflação”, afirmou Wong.
Nesse contexto, o papel do ouro como proteção contra a incerteza do mercado “ganha nova importância”, acrescentou.
*Com informações de Osmond Chia, repórter de Negócios da BBC News.
Fonte.:BBC NEWS BRASIL