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Mesmo após o governo do Equador declarar estado de exceção, os protestos não parecem diminuir no país.
Os confrontos entre manifestantes e forças policiais já deixaram um morto, mais de 80 feridos e cerca 100 pessoas detidas.
Inés Manzano, ministra do Meio Ambiente e Energia, afirmou que cerca de 500 pessoas “estavam atirando pedras” no carro do presidente e acrescentou que também havia “marcas de bala”, enquanto o mandatário chegava a um evento no município de El Tambo, na província de Cañar, no sul do país.
Um vídeo compartilhado pela assessoria do presidente com a BBC mostra manifestantes lançando pedras contra um carro e três pequenos buracos em uma das janelas.
Especialistas consultados pela BBC Verify, o serviço de verificação da BBC, determinaram que não há nenhuma evidência que permita concluir que os manifestantes dispararam balas contra o comboio presidencial.
Segundo Amael Kotlarski, especialista em armas da empresa de inteligência de defesa Janes, as marcas visíveis no carro em que se acredita que Noboa viajava são “mais consistentes com pedras ou projéteis lançados à mão” do que com balas.
Por sua vez, Lewis Galvin, analista da consultoria de risco estratégico Sibylline, disse à BBC que a maior parte dos danos observados nos veículos do comboio parece ter sido causada por pedras.
Enquanto o governo acusa vários manifestantes de serem terroristas, a Confederação de Nacionalidades Indígenas do Equador (Conaie), a maior organização indígena do país, afirmou no X que cinco de seus membros foram “detidos arbitrariamente”.
A organização também denunciou uma “brutal ação policial e militar” e uma “violência orquestrada contra o povo mobilizado”.
“Entre os agredidos há mulheres idosas”, acrescentou a Conaie na publicação, que inclui um vídeo em que quatro policiais com coletes à prova de balas e o rosto coberto aparecem prendendo uma mulher vestida com trajes tradicionais indígenas.
O governo equatoriano adiantou que as cinco pessoas detidas seriam processadas por terrorismo e tentativa de assassinato.
Há duas semanas, o Equador vive uma série de protestos que se intensificaram com o passar dos dias.
Nesta reportagem, a BBC News Mundo, serviço em espanhol da BBC, explica três fatores que ajudam a entender a evolução desses protestos.
1. Eliminação dos subsídios ao diesel

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O governo de Daniel Noboa anunciou, em 12 de setembro, o fim do subsídio ao diesel devido ao alto custo que representava para o Estado e afirmou que os recursos antes destinados à sua manutenção seriam redirecionados para programas de proteção social e subsídios voltados a incentivar a produção nacional.
Noboa foi eleito presidente do Equador em 2023, após a renúncia de Guillermo Lasso, e reeleito em 2025, com uma plataforma de propostas liberais para a economia.
Segundo o governo, a medida permitiria uma economia de US$ 1,1 bilhão (R$ 5,87 bi) por ano, mas críticos afirmam que ela provocará um aumento considerável no custo de vida dos equatorianos e terá um impacto ainda maior sobre pequenos agricultores, pescadores e comunidades indígenas do país.
A eliminação do subsídio fará com que o preço do diesel passe de US$ 1,80 (R$ 9,60) para US$ 2,80 (R$ 14,95) por galão, um aumento de 56%. A moeda oficial do Equador é o dólar americano.
Em protesto contra a decisão controversa, a organização indígena Conaie convocou, em 18 de setembro, uma greve nacional “imediata e por tempo indeterminado”.
A paralisação provocou bloqueios de estradas e danos à infraestrutura em várias partes do país.
Os dois últimos presidentes do Equador também tentaram acabar com os subsídios ao diesel, mas as medidas geraram grandes protestos que os obrigaram a recuar.
Noboa, no entanto, parece decidido a manter sua posição firme.
“Aqueles que optarem pela violência enfrentarão a lei. Aqueles que agirem como criminosos serão tratados como criminosos”, declarou Noboa no X no domingo.
2. Estado de exceção

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Rapidamente após a convocação da greve nacional, Daniel Noboa declarou estado de exceção em sete das 24 províncias do país, numa tentativa de frear os protestos.
No estado de exceção, um presidente suspende direitos da população devido a alguma situação de descontrole institucional.
A medida teve inicialmente um alcance limitado. Mas, pouco a pouco, os protestos foram se espalhando e, em 28 de setembro, uma pessoa perdeu a vida em uma das manifestações na cidade andina de Cotacachi, na província de Imbabura, ao norte da capital, Quito.
A vítima foi identificada como Efraín Fuerez, integrante indígena da comunidade de Cuicocha.
Segundo a Conaie, ele foi morto por um disparo das Forças Armadas, algo que as autoridades não confirmaram.
Diante do crescimento das manifestações, que o governo tem qualificado como violentas, Noboa ampliou no sábado (4/10), o estado de emergência para 10 das 24 províncias do país e suspendeu por 60 dias o direito à liberdade de reunião.
3. Denúncias de violação de direitos humanos

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Aos manifestantes — em sua maioria membros de comunidades indígenas — somaram-se centenas de estudantes em Quito.
Agora, além de protestarem contra a eliminação do subsídio ao diesel, os manifestantes também exigem a libertação das centenas de pessoas detidas durante os protestos.
Pelo menos 13 delas enfrentam acusações de terrorismo.
No fim de setembro, as Forças Armadas equatorianas afirmaram no X que as manifestações estavam “infiltradas por grupos terroristas”.
“Doze militares ficaram feridos enquanto escoltavam um comboio de alimentos que foi emboscado (…) a prova mais evidente de que o protesto não é pacífico.”
A Conaie, maior organização social do país, rejeitou por sua vez “o uso letal da força por parte das Forças Armadas contra membros das comunidades indígenas”.
Enquanto isso, organizações internacionais, como a Anistia Internacional, expressaram preocupação com o que consideram um “deterioramento na proteção dos direitos humanos no Equador”.
A organização citou múltiplas denúncias de uso excessivo da força contra manifestantes, possíveis detenções arbitrárias, abertura de processos penais abusivos e o congelamento de contas bancárias de líderes sociais e manifestantes.
Ana Piquer, diretora para as Américas da Anistia Internacional, afirmou no início deste mês que a entidade havia recebido informações “preocupantes” sobre “ações impulsionadas pelo Executivo que buscam silenciar a dissidência e favorecer a impunidade”.
“A repressão aos protestos, os ataques à Corte Constitucional e a insistência em uma estratégia de segurança militarizada — apesar de sua comprovada ineficiência para conter o crime e das graves violações de direitos humanos que provocou — colocam o Equador na lista de países da região que vivem um preocupante avanço de práticas autoritárias”, acrescentou.
Fonte.:BBC NEWS BRASIL