Especialistas do setor público e privado defenderam uma revisão das regras brasileiras para concessão de benefícios fiscais durante evento nesta terça (26) que mobilizou a cúpula do Legislativo.
A avaliação de especialistas no tema é que os incentivos classificados como gastos tributários carecem de monitoramento e avaliação de resultados. Também é raro que haja metas a serem alcançadas e praticamente não há contrapartidas exigidas das empresas beneficiadas.
O resultado disso é uma briga de lobbies, que resulta em políticas de incentivo mal desenhadas e que contribuem para aumentar as desigualdades.
“A gente tem pouco controle, avalia muito pouco e cria o benefício sem sequer saber onde quer chegar”, disse Bruno Carazza, professor associado da Fundação Dom Cabral, ao apresentar o resultado de um estudo sobre políticas para o setor industrial que mostrou essas fragilidades.
Débora Freire Cardoso, subsecretária de Política Fiscal do Ministério da Fazenda, afirmou que o governo trabalha na elaboração de uma proposta de monitoramento, com objetivo de fazer uma relação entre incentivos e variáveis sociais e ambientais.
“Temos um contingente grande de benefícios, e muitos não são eficientes. Muitos funcionam, é uma política pública válida, mas precisamos ter um fluxo mais integrado de avaliação para revisar benefícios tributários.”
Eles participaram nesta terça (26) do evento “Gastos tributários: caminhos para a eficiência”, realizado pelo TCU (Tribunal de Contas da União), Instituto MaisProgresso.org e pelas consultorias de Orçamento da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.
O debate também contou com a participação dos presidentes da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), e do TCU, ministro Vital do Rêgo, entre outros parlamentares, e do secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas.
Os três destacaram a convergência de interesse entre Executivo e Legislativo para tratar da questão. “A revisão dos gastos tributários pode ser uma pauta que une não só Câmara e Senado, mas também governo e oposição. Todos têm de defender uma coisa que é a eficiência do Estado.”
FolhaJus
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PERSE
Representantes do governo apontam a falta de flexibilidade para que seja possível cortar o benefício de empresas que não deveriam estar na lista daquelas contempladas, como aconteceu com o Perse, programa para o setor de eventos que terminou neste ano.
O programa foi criado para proteger empresas prejudicadas pelas restrições impostas durante a Pandemia, mas teve como maiores beneficiários empresas de entrega e influenciados digitais que aumentaram seu faturamento durante o período. Muitas delas usufruem do incentivo por meio de decisão judicial.
Claudemir Malaquias, chefe do Centro de Estudos Tributários da Receita Federal, afirmou que o Brasil concede a maior parte dos benefícios por meio de lei, o que tira das autoridades tributárias a possibilidade de negar a sua apropriação caso se verifique irregularidades. Além disso, muitos incentivos são aprovados sem considerar o conjunto de políticas governamentais.
“A gente olha muito para a árvore e esquece de olhar para a floresta”, disse. “Uma política pública mal desenhada contribui para aumentar as diferenças.”
Para Fernando Moutinho, consultor de Orçamento do Senado, o debate sobre a questão fiscal criou uma oportunidade para mudar esse quadro. Ele disse que a concessão de benefícios é dominada por lobbies setoriais e que essas políticas têm feito com que o Estado seja responsável por sustentar o desenvolvimento da iniciativa privada.
“Ajuste fiscal era só Previdência e BPC [Benefício de Prestação Continuada], o orçamento do pobre. O orçamento do rico não entrava. Em função do esgotamento fiscal, estamos com uma janela de oportunidade que possivelmente é estreita de poder trazer isso para a mesa.”
Guilherme Cezar Coelho, fundador do Instituto MaisProgresso.org, afirmou que o Brasil pode utilizar de maneira muito mais eficiente as políticas de incentivo fiscal, com resultados mais alinhados aos objetivos de gerar mais crescimento econômico e reduzir a desigualdade de renda.
“Essas duas agendas estão umbilicalmente ligadas. Países tão desiguais como o Brasil não podem crescer mais justamente porque têm uma má distribuição de renda. Temos pouco mercado interno, má alocação de recursos, e a discussão fiscal e tributária é fundamental para endereçar isso.”
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Fonte.:Folha de S.Paulo