Em um checkup bucal, descobri que, por trás de minha dificuldade para dormir, estava um problema grave de saúde. O dentista que me atendeu descobriu um colapso da língua anteroposterior em estágio avançado.
Mas o que significa isso? A princípio, a língua estava “caída” em minha faringe, o que obstruía as vias aéreas superiores durante o sono.
Pelos exames, foi possível identificar que tanto o meu maxilar superior quanto o inferior estavam para trás, pressionando uma região chamada orofaringe, por onde o ar passa até os pulmões. Somado a isso, houve o relaxamento excessivo dos músculos da garganta durante o sono, permitindo que a língua deslizasse para trás e, com isso, bloqueasse a passagem do ar.
O resultado levou a outro exame, dessa vez a sonoendoscopia, que avaliou a anatomia da via aérea superior durante esse período de descanso, e permitiu visualizar como e onde ocorriam as obstruções.
Nesse exame, me puseram para dormir de barriga para cima para a realização de projeções de como ocorreria a respiração se minha mandíbula fosse posicionada de forma diferente. Ao colocar a mandíbula mais para a frente, foi observado um aumento acentuado de entrada de oxigênio por aquela passagem obstruída.
O exame culminou no veredito final: baixa saturação e obstruções físicas nas vias aéreas que explicam a queda do oxigênio. Eu tinha uma saturação de oxigênio de 53% durante o sono, o normal é acima de 95%.
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Um ano de vida
Dr Marcelo Kyrillos, cirurgião-dentista do Ateliê Oral, que descobriu o caso durante seu checkup bucal, foi taxativo: “Gerson, você praticamente não respira dormindo, está correndo o risco de ter uma parada cardíaca ou um AVC nesse período”.
Além do Dr Kyrillos, conversei com demais médicos de minha confiança, entre eles clínico geral, cardiologista e até de medicina ortomolecular, e todos eles disseram: ‘Cara, você vai morrer. Com essa saturação, você tem, no máximo, um ano de vida”.
O que antes era desconhecido passou a ser um cronômetro de vida.
Meu tratamento
Com o diagnóstico de apneia obstrutiva do sono (AOS) passei a dormir com um aparelho, chamado CPAP, que fornecia ar sob pressão para as vias aéreas, o que seria temporário até o final do tratamento.
Após os exames, passei por outros profissionais da clínica para a avaliação da mordida, que também estava prejudicada. O tratamento consistia em colocar os dentes na posição correta dentro do osso, e os maxilares também na posição correta, de acordo com o crânio, liberando a respiração.
Usei um aparelho e miniplacas ortodônticas e retirei os sisos para corrigir a mordida e o alinhamento dentário. Tal correção permitiu o avanço da mandíbula.
Também passei por uma cirurgia, chamada de ortognática, para corrigir as bases ósseas e permitir que as vias aéreas fossem desobstruídas. Por fim, lentes dentais para a correção das engrenagens dos dentes.
Após esse processo, a saturação de oxigênio no cérebro passou de 53% para 98% durante o sono.
Algo que os dentistas que me acompanharam explicaram e vale esse espaço aqui para detalhar: a retração dos maxilares e a queda da língua são apenas alguns dos fatores que podem obstruir as vias aéreas e levar à AOS. Amígdalas aumentadas, desvio de septo nasal ou um palato (céu da boca) mole alongado e excesso de tecido adiposo na região do pescoço são outros fatores determinantes, assim como obesidade, consumo de álcool e sedativos ou mesmo idade avançada.
Eu não sabia o quão grave era a situação, apesar de ter sintomas claros de cansaço físico, sonolência durante o dia, falta de disposição — mesmo com a minha idade e com o fato de ser atlético — irritação, mau humor e estresse. Imagino quantas pessoas passam pela mesma situação, acreditando que é a apenas uma privação de sono.
Por isso, é válido exigir dos profissionais checkups verídicos. Não se trata de abrirem sua boca e fazerem uma limpeza de tártaro com aplicação de flúor. Isso é subestimar muito a importância de toda a região da cabeça e pescoço.
No meu caso, o checkup na clínica incluía fotografias da face e o escaneamento dos dentes — para a avaliação da harmonia das bases ósseas, além de tomografia — um exame esquelético 3D para avaliar os maxilares e os dentes, entre outros procedimentos que conferiram assim a descoberta do que poderia me levar a vida lentamente.
Acredito que essa minha experiência contada é de utilidade pública que pode ajudar a salvar vidas: não poderia supor que um checkup bucal pudesse me livrar do que poderia ter sido uma parada cardíaca ou um AVC. Parece exagero, mas foi o que aconteceu.
*Gerson T. Gitirana é empresário
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Fonte.:Saúde Abril