
O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria nesta quinta-feira (27) para obrigar o governo a criar um plano nacional contra o “racismo estrutural”. Os ministros, no entanto, não chegaram a um acordo sobre a declaração de um “estado de coisas inconstitucional”.
Esse dispositivo é utilizado para reconhecer a existência de uma violação massiva e generalizada de direitos fundamentais que afeta grande parcela da população. Os ministros Luiz Fux, relator do caso, Flávio Dino e Cármen Lúcia votaram pela adoção de medidas contra o racismo e para reconhecer o dispositivo.
Os ministros Cristiano Zanin, André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli também defenderam que sejam tomadas providências, mas rejeitaram o “estado de coisas inconstitucional”.
O julgamento foi interrompido e será retomado em data ainda não divulgada. Faltama os votos do presidente do STF, Edson Fachin, e do ministro Gilmar Mendes. A Corte analisa a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 973 protocolada pelo PT, PSOL, PSB, PCdoB, Rede, PDT e PV.
Nesta tarde, Zanin foi o primeiro a votar. Ele aderiu às proposições e providências constantes no voto do relator, reconhecendo “graves violações de preceitos fundamentais”, mas sem declarar o “estado de coisas inconstitucional”, divergindo neste ponto.
Zanin considerou que existem “graves violações de preceitos fundamentais” da população negra e defendeu que sejam determinadas providências para mitigá-las, considerando as iniciativas vigentes.
“Na minha compreensão, o fato de existirem políticas públicas a partir da década de 1990, de 2003 e mais recentemente outras leis não indicam uma inércia do poder público. Esse é o critério que estou utilizando”, disse.
Fux ponderou que o entendimento do colega é uma contradição. “Entendo que não reconhecer o estado de coisas inconstitucional é uma maneira de afastar a responsabilidade imputável a quem de direito”, disse o relator.
Mendonça e Moraes se manifestam contra a adoção do conceito de “racismo institucional”
O ministro André Mendonça acompanhou o voto de Zanin. Ele concordou com a existência de “racismo estrutural” na sociedade. No entanto, o ministro disse ter “dificuldade” com o conceito de racismo institucional.
“Não posso partir do pressuposto que instituições públicas são racistas, acho que pessoas dentro das instituições são racistas”, afirmou Mendonça.
Na mesma linha, o ministro Nunes Marques apontou que, quando se fala em racismo institucional, “pode se confundir que o governo brasileiro está aparelhado para ser catalisador desse processo”.
Para ele, é “inegável que essa violação de direito fundamental é antiga e sistêmica”. Nunes Marques acompanhou o entendimento de Zanin e Mendonça.
O ministro Alexandre de Moraes concordou com Mendonça quanto ao racismo institucional. Ele considerou que a declaração de estado de coisas inconstitucional não muda, na prática, as medidas que devem ser implementadas contra o racismo.
“Racismo estrutural existe, é uma chaga e permanece econômica, social e culturalmente. Não é jurídico, isso é muito importante. Quando se pede a declaração do estado de coisas inconstitucional é porque haveria um racismo estrutural do estado voltado a exterminar a população negra. Não há isso”, enfatizou.
Fux rebateu e destacou que a “pecha” sobre a discussão tratar apenas de “divagações acadêmicas” e “proclamações” não procede. “Todo mundo reconheceu violações e omissões… Meu voto não é contemplativo, é efetivo”, apontou o relator.
O ministro Dias Toffoli ressaltou avanços em políticas públicas atuais para o enfrentamento ao racismo. Ele concordou com o voto do relator, mas sem reconhecer a existência de um “estado de coisas inconstitucional”.
Cármen Lúcia acompanha voto de Fux
Última a votar, a ministra Cármen Lúcia acompanhou o voto de Fux, inclusive para reconhecer o “estado de coisas inconstitucional” em razão da “insuficiência de todas as medidas e providências tomadas até aqui”.
“Eu não espero viver em um país em que a Constituição para o branco seja plena e para o negro seja quase. Quero uma Constituição que seja plena, igualmente para todas as pessoas”, disse a ministra.
AGU se compromete a implementar plano nacional contra o racismo
Em nota, a Advocacia-Geral da União (AGU) reafirmou nesta quarta (26) o compromisso de elaborar, “em prazo razoável”, um Plano Nacional de Enfrentamento ao Racismo Institucional. O órgão defendeu a necessidade de atuação conjunta de todos os Poderes.
“Somente com essa ação conjunta é possível consolidar políticas duradouras, capazes de transformar realidades e garantir que os avanços até aqui conquistados se mantenham e se ampliem para o futuro”, disse a AGU.
Fonte. Gazeta do Povo


