Um empadão de frango servido no alto da Babilônia, uma casa coberta por mais de 380 relógios no Santa Marta e uma maquete de tijolos pintados que conta a história das favelas em miniatura, em Laranjeiras.
São atrações pouco conhecidas do grande público, mas que agora ganham destaque em um roteiro turístico. O Guia das Favelas, feito pelo Instituto Aupaba, convida cariocas e turistas a encarar o Rio de Janeiro por uma nova lente, revelando experiências que vão além das paisagens já famosas da cidade.
Lançada neste sábado (27), a publicação produzida em português, espanhol e inglês, percorre territórios como Vidigal, Rocinha, Mangueira, Providência, Pavão-Pavãozinho, Cantagalo, Babilônia, Chapéu-Mangueira e Santa Marta.
Em cada um deles, o visitante encontra projetos sociais, espaços culturais, restaurantes e trilhas que revelam como as comunidades se reinventam e abrem suas portas para o turismo de forma sustentável e acolhedora. “É um convite a descobrir a favela de dentro para fora, reconhecendo-a como espaço de criatividade, resistência e futuro”, resume o texto de apresentação.
Na Babilônia, o roteiro mistura gastronomia e consciência ambiental. O Bar do David, tricampeão do concurso Comida di Buteco, é famoso por pratos como o feijão com frutos do mar, que atraem tanto turistas quanto moradores recém-chegados da praia do Leme.
Logo acima, a Cantina da Val se tornou parada obrigatória pelo empadão de frango, além de bolos e biscoitos caseiros. Já o projeto Favela Orgânica apresenta um outro sabor da comunidade: hortas urbanas, compostagem e oficinas de gastronomia sustentável que fazem sucesso dentro e fora do país.
No Vidigal, conhecido pela trilha que leva ao topo do Morro Dois Irmãos — uma das vistas mais celebradas do Rio —, o guia propõe novas paradas. O Parque Ecológico Sitiê, criado em uma área que antes era um lixão, hoje abriga hortas, espaços verdes e atividades de educação ambiental. Quem se interessa por artes cênicas pode visitar o grupo Nós do Morro, que revelou talentos como Seu Jorge, enquanto os que sobem as ladeiras encontram refresco na Sorveteria da Leka.
A Rocinha, maior favela do país, aparece a partir de sua intensa produção cultural. A Escola de Música da Rocinha, criada em 1994, já formou centenas de jovens. O projeto Nós do Crochê aposta no artesanato como transformação social. Os visitantes podem subir ao Mirante Rocinha, que abre a paisagem para o Cristo Redentor e o Pão de Açúcar, ou experimentar a culinária caseira em restaurantes locais.
No Santa Marta, em Botafogo, a fama internacional veio em 1996, quando Michael Jackson gravou ali o clipe de “They Don’t Care About Us”. A estátua do cantor é até hoje o ponto mais visitado, mas o guia vai além. O Bar do Tota, com sua feijoada servida aos sábados, e a Casa dos Relógios, coleção da moradora Maria Helena, que reúne mais de 380 peças espalhadas por todos os cômodos, oferecem experiências inesperadas. Do mirante a 360 metros de altura, o visitante tem uma das vistas mais amplas da cidade.
Já o Morro da Providência, considerado a primeira favela do Brasil, é apresentado como destino histórico e cultural. Ali nasceu Machado de Assis, e hoje o local abriga iniciativas como o Circuito da Herança Africana e a Casa Amarela, espaço de encontros culturais e resistência negra. Os passeios guiados, como o Rolé dos Favelados, misturam história e vivência comunitária, enquanto o Bar da Jura atrai pela comida com “tempero de vó” e pelas atrações musicais.
Outros destaques incluem o Museu do Samba, aos pés da Mangueira, dedicado à preservação da maior festa popular do país, e o Projeto Morrinho, na comunidade Pereira da Silva. Nesse espaço, tijolos pintados viram cenário de um Rio em miniatura, com ruas, vielas e personagens que contam, em escala reduzida, as histórias das favelas cariocas.
Fonte.:Folha de S.Paulo