
Crédito, Warner Bros
- Author, Nicholas Barber
- Role, BBC Culture
Uma Batalha Após a Outra, do cineasta Paul Thomas Anderson, é um dos filmes mais aclamados do ano, com inúmeras críticas elogiosas que o classificam como uma obra-prima.
E mais: os críticos concordam que não se trata daquele tipo de filme que você assiste mais por obrigação do que por diversão — e que costumam ser difíceis de assistir, mas trazem um certo conforto no final.
Pelo contrário, o consenso da crítica é de que Uma Batalha Após a Outra proporciona uma experiência cheia de ação e extremamente divertida no cinema.
“É impossível dizer o quanto esse filme é divertido”, afirma Max Weiss na Baltimore Magazine.
“É uma viagem incrível”, conclui Nick Bradshaw na Sight & Sound.
Adicione a isso o poder do protagonista Leonardo DiCaprio, sem falar nos coadjuvantes Sean Penn e Benicio del Toro, que você terá todos os elementos para um sucesso de bilheteria.
Na semana passada, a revista Variety informou que vários filmes recentes voltados para o público adulto não alcançaram o sucesso esperado, entre eles O Bom Bandido e Coração de Lutador.
Mas o maior fracasso de todos foi Uma Batalha Após a Outra.
“Embora a arrecadação global de US$ 140 milhões (cerca de R$ 750 milhões) seja impressionante para um filme que é original, com classificação para adultos e quase três horas de duração, Uma Batalha Após a Outra precisaria de aproximadamente US$ 300 milhões para atingir um ponto de equlíbrio”, dizia o artigo.
O orçamento do filme foi de US$ 130 milhões, de acordo com a Warner Bros, estúdio responsável pela obra. Apesar disso, algumas fontes estimam que o valor possa ultrapassar essa cifra em mais de US$ 10 milhões.
Com os custos de marketing somados, a obra pode registrar “um prejuízo de cerca de US$ 100 milhões”, afirma a Variety.

Crédito, Joe Maher/Getty Images
O artigo inclui uma declaração da Warner Bros contestando os números apresentados pela Variety, mas ninguém diz que o filme esteja fazendo uma fortuna.
Uma Batalha Após a Outra já está em cartaz há quatro fins de semana desde seu lançamento no fim de setembro, e segundo o site Box Office Mojo, sua arrecadação totaliza US$ 162 milhões.
Para aqueles que gostariam de ver mais diversidade de filmes autorais nas salas de cinema, esses números parecem, à primeira vista, desanimadores e até mesmo confusos.
Se o público não aparece para um “passeio de montanha-russa” com Leonardo DiCaprio, vai aparecer para o quê?
A resposta mais simples é sombria: na era pós-pandemia, quando tantos filmes estão disponíveis nos serviços de streaming, parece que apenas as franquias de grandes sucessos de bilheteria e filmes de terror ainda conseguem levar multidões para o cinema.
Mas essa é apenas uma parte da história.
Sob outra perspectiva, a situação de Uma Batalha Após a Outra pode ser vista como motivo de comemoração.
“Acho que o filme está indo fenomenalmente bem”, afirma Charles Gant, editor da Screen International.
“Justamente porque o público está adorando, o boca a boca é super positivo, e o filme se encaixa bem na experiência premium dos formatos de grande tela. Ele já arrecadou quase o dobro do sucesso anterior de Paul Thomas Anderson, e isso deve aumentar bastante”.
Um ponto a ser lembrado é que o filme certamente terá uma longa vida útil.
Pode não alcançar os números dos Vingadores, mas fará mais dinheiro nos cinemas após as inevitáveis indicações ao Oscar. E, como filme aclamado que tende a perdurar, ainda vai gerar receitas significativas com relançamentos, streaming e TV.
Isso não significa que vá se tornar uma mina de ouro para a Warner Bros, mas também não é um fracasso chocante.
O fato é que Anderson é um cineasta essencialmente autoral e, por mais que os críticos tenham vendido o longa como uma “ação-comédia”, Uma Batalha Após a Outra é um filme de arte.
Seus ritmos frenéticos, a trilha sonora tensa, os personagens profundamente falhos, o conteúdo político intenso e a mistura excêntrica de seriedade e ironia marcam a obra de um roteirista-diretor que está determinado a seguir suas próprias ambições criativas, apesar de resultados não comerciais.
As críticas e o boca a boca podem ser excelentes, mas o filme ainda é desafiador para quem está em busca de um sucesso de bilheteria na sexta à noite.
Um bom investimento?
O verdadeiro motivo pelo qual sua bilheteria parece decepcionante é o orçamento astronômico.
“O alto custo da produção torna difícil alcançar a lucratividade, isso eu admito”, disse Gant.
O maior sucesso de Anderson até então era Sangue Negro, que arrecadou US$ 76,9 milhões em 2007. Na outra ponta, Vício Inerente — que assim como Uma Batalha Após a Outra foi inspirado em um romance de Thomas Pynchon — fez apenas US$ 14,5 milhões em 2014.
Para a Warner Bros, portanto, assinar um cheque desse volume, mesmo antes de somar os custos de marketing, sempre foi uma grande aposta.
Então, por que o estúdio acreditava que era um risco que valia a pena correr?
Alguns filmes, ao que parece, têm valor de formas que não aparecem imediatamente nas planilhas de contabilidade.
“É o tipo de filme os executivos apontam quando são criticados por não fazerem mais ‘filmes de verdade'”, diz John Bleasdale, autor de The Magic Hours: The Films and Hidden Life of Terrence Malick.
“E também serve para atrair mais talentos para o estúdio, que é mais importante do que dinheiro.”
Por mais que os executivos da Warner esperassem por um estouro de bilheteria, é útil para o estúdio manter a reputação de “lar acolhedor” para projetos prestigiados de cineastas queridos.
Christopher Nolan, por exemplo, trabalhou com a Warner Bros por quase 20 anos, até romper com o estúdio devido a divergências sobre a distribuição de Tenet, em 2020.
Esse rompimento custou caro à Warner, já que levou Nolan para a Universal, onde ele fez Oppenheimer, um dos maiores sucessos internacionais de 2023.

Crédito, Reprodução/Warner Bros
Isso explica porque a Warner estava tão ansiosa para assinar contrato com Ryan Coogler, diretor de Pantera Negra e Creed.
Coogler acabou fazendo Pecadores (2025) com a Warner e o filme se tornou um sucesso de bilheteria.
Com isso em mente, qualquer projeto que atraia cineastas desse calibre já pode ser visto como um bom investimento.
“Quando Terry [Malick] fez Cinzas no Paraíso para a Paramout, Charles Bluhdorn, o presidente do estúdio, disse: ‘Eu não me importo se nunca ganharmos um dólar com isso. Eu quero que você continue fazendo filmes com a gente’.”
É claro que esse tipo de estratégia a longo prazo só é possível se os outros filmes do estúdio forem lucrativos.
Felizmente, para a Warner, alguns dos maiores sucessos de 2025 estão em seu catálogo: além de Pecadores, títulos como Um Filme Minecraft, Premonição 6: Laços de Sangue, F1, Super-Homem, A Hora do Mal, e Invocação do Mal 4.
Se Uma Batalha Após a Outra não tem sido tão lucrativo, ao menos fortaleceu a reputação da Warner como um estúdio aberto a cineastas autorais, consolidou a parceria com Paul Thomas Anderson e rendeu um filme altamente respeitado — e forte candidato na temporada de premiações.
Além disso, como observa Bleasdale, “eles conseguem fazer o Leonardo DiCaprio aparecer na festa de Natal do estúdio”.
Então, será que o estúdio fez bem em bancar o filme?
“Considerando tudo que a Warner tem feito neste ano, é uma decisão óbvia”, afirma Lucas Shaw em um episódio recente do podcast The Town, sobre a indústria do cinema.
“Você tem um filme de um grande diretor contemporâneo, com ótimas críticas, e agora, com Pecadores, dois fortes concorrentes aos Oscar. Paul Thomas Anderson [que nunca ganhou um Oscar] pode finalmente levar sua estatueta e você pode chamar isso de vitória, já que outros sucessos cobriram o investimento. Veja, você dirige um estúdio de filmes, precisa estar disposto a dar saltos grandes.”
Toda essa situação lembra O Estúdio, série de comédia da Apple TV criada por Seth Rogen sobre os executivos de Hollywood. Um dos episódios é dedicado ao desespero do chefe de estúdio por alguém que o agradeça no palco do Globo de Ouro — a piada sugere que a indústria cinematográfica não se resume apenas a lucro.
Há também a cena em que a personagem de Catherine O’Hara resume sua experiência de administrar um estúdio.
“O trabalho te deixa estressada, em pânico, miserável. Mas quando tudo dá certo e você faz um bom filme, ele é bom para sempre.”
O Estúdio pode retratar Hollywood com certo romantismo, mas, se ainda existem executivos dispostos a gastar mais de US$ 130 milhões para fazer “um bom filme”, isso já é motivo de comemoração.
E talvez Uma Batalha Após a Outra nem tenha sido um grande risco.
Se você produz uma animação, um filme de super-herói ou uma adaptação de videogame que fracassa, como Smurfs, Flash, não há como se consolar falando de arte e prestígio.
Mas se você investe dinheiro em um filme de Paul Thomas Anderson, independentemente do que acontecer na bilheteria, você ainda tem um filme de Paul Thomas Anderson.
E, muito provavelmente, vai se orgulhar disso. De certa forma, é a aposta mais segura que um executivo de estúdio pode fazer.
Fonte.:BBC NEWS BRASIL