
Crédito, NASA/JPL
- Author, Rebecca Morelle
- Role, Editora de ciências da BBC News
- X, @BBCMorelle
Rochas com características incomuns, descobertas em Marte, formam a evidência mais fascinante já encontrada sobre a possível existência de vida no planeta vermelho em um passado remoto.
O robô Perseverance, da Nasa, encontrou argilitos em um leito de rio coberto de pó que apresentam marcas fascinantes. Os cientistas as chamam de manchas de leopardo e sementes de papoula.
Eles acreditam que estas marcas contêm minerais produzidos por reações químicas que podem ser associadas a antigos micróbios marcianos.
Os estudiosos também consideram a possibilidade de que esses minerais sejam o resultado de processos geológicos naturais.
Mas a Nasa afirmou, em entrevista coletiva, que as marcas podem ser os sinais mais claros de vida já encontrados no planeta.
A descoberta é significativa. Ela atende aos critérios que a Nasa define como “potenciais bioassinaturas”.
Isso significa que os minerais serão objeto de investigações mais profundas para determinar se sua origem é realmente biológica.
“Nós não tínhamos nada como isso antes e, por isso, acho que é importante”, declarou o cientista planetário Sanjeev Gupta, do Imperial College de Londres.
“Descobrimos características nas rochas que, se fossem vistas na Terra, poderiam ser explicadas pela biologia — por processos microbianos”, explica ele. “Não estamos dizendo que encontramos vida, mas, sim, que elas realmente nos dão algo para irmos atrás.”
“É como observar um fóssil preservado. Talvez seja o resto de uma refeição, talvez aquela refeição tenha sido excretada e seja o que estamos vendo aqui”, afirmou Nicola Fox, administrador associado da Nasa para a Diretoria de Missões Científicas, durante a entrevista coletiva.

A única forma de confirmar com total certeza se os minerais foram gerados por micróbios seria trazer as rochas para análise na Terra.
A Nasa e a Agência Espacial Europeia (ESA, na sigla em inglês) propuseram uma missão de transporte de amostras de Marte, mas o futuro da empreitada ainda parece muito incerto.
O orçamento da agência espacial americana enfrenta enormes cortes definidos pelo presidente Donald Trump para 2026. E um dos planos sendo cancelados é uma missão para retorno dessas amostras.

Crédito, NASA/JPL-CALTECH/MSSS/Reuters
Hoje em dia, Marte é um deserto frio e árido.
Por isso, ele é um local promissor para a busca de possíveis sinais de vida no passado.
O robô Perseverance pousou na superfície de Marte em 2021, em busca de sinais biológicos. Ele passou os últimos quatro anos explorando uma cratera chamada Jezero, que foi um antigo lago para onde fluía um rio.
O robô encontrou as rochas com manchas de leopardo no ano passado, no fundo de um cânion escavado pelo rio, em uma região chamada formação Bright Angel.
Elas têm cerca de 3,5 bilhões de anos de idade e são de um tipo de rocha chamado argilito, uma rocha com granulação fina, formada a partir da argila.
“Nós meio que soubemos imediatamente que havia acontecido alguma química interessante naquelas rochas e logo ficamos muito entusiasmados”, conta Joel Hurowitz, da Universidade Stony Brook em Nova York, nos Estados Unidos.
O cientista também faz parte da missão Perseverance e é o principal autor do artigo publicado na Nature.

O Perseverance empregou diversos instrumentos do seu laboratório de bordo para analisar os minerais existentes nas rochas.
Os dados foram transmitidos para a Terra, para que os cientistas pudessem estudá-los.
“Achamos ter encontrado evidências de um conjunto de reações químicas ocorridas na lama depositada no fundo do lago”, explica Hurowitz.
“Estas reações químicas aparentemente ocorreram entre a própria lama e material orgânico — e estes dois ingredientes reagiram, formando novos minerais.”
Em condições similares na Terra, as reações químicas que criam minerais são tipicamente realizadas por micróbios.
“Esta é uma das possíveis explicações do motivo que levou estes elementos a aparecerem nas rochas”, segundo Hurowitz. “Parece ser o caso mais fascinante de uma possível bioassinatura que já detectamos até hoje.”
Os cientistas também examinaram como os minerais poderiam ter se formado sem a participação de micróbios.
Eles concluíram que processos geológicos naturais podem ter causado as reações químicas. Mas, para isso, seria necessário ter altas temperaturas e as rochas não parecem ter sido aquecidas.
“Encontramos algumas dificuldades para os processos não biológicos”, destacou Hurowitz. “Mas não podemos descartá-los por completo.”

Crédito, NASA/JPL
Estas amostras foram armazenadas em cartuchos e serão depositadas sobre a superfície de Marte, à espera de uma missão que possa recolhê-las.
Os planos da Nasa para esta tarefa estão em suspenso, devido à ameaça de cortes orçamentários.
Mas a China também planeja uma missão de retorno de amostras, que poderá ser lançada em 2028.
O debate sobre a decisão permanece em aberto, mas os cientistas aguardam desesperadamente a oportunidade de colocar suas mãos — e luvas — nas rochas.
“Precisamos ver estas amostras na Terra”, segundo Gupta.
“Acho que, para ter total certeza, a maioria dos cientistas irá querer observar e examinar essas rochas na Terra. É uma das nossas amostras de alta prioridade para transporte.”
Fonte.:BBC NEWS BRASIL